A visão corporativa ganha mais importância cada dia que passa, devido ao fato de as empresas avançarem para modelos administrativos mais descentralizados e com menos gerentes médios. Ela deve ser como a "Constituição" de um país, porém formulada em um enunciado mais claro e direto.
Segundo Richard Allen, a visão ideal deve mostrar onde a empresa está, aonde quer chegar e que meios serão necessários para atingir esse objetivo. Só assim ela conseguirá motivar os funcionários, dar um rumo aos negócios e avaliar o progresso da empresa, comparando resultados. A seguir se propõe um modelo de elaboração de visão corporativa e se relaciona as várias perguntas que devem ser respondidas no decorrer do processo. Enfatiza-se que redigir essa "Constituição" não é uma tarefa apenas dos altos executivos, mas de toda a organização.
Uma conhecida canção diz que "em um dia claro você pode enxergar o infinito". Bonito. Por mais claro que o dia esteja, no entanto, não é possível enxergar muito longe sem um visão nítida.
Tendemos a esquecer essa verdade fundamental. Para o especialista C. Lee, "o conceito de visão nunca foi tão importante como no mundo de hoje, de organizações achatadas, desestratificadas e descentralizadas". Uma visão clara é igualmente importante para empresas e pessoas que nelas trabalham, em todos os níveis.
De acordo com a publicação Info-Line, a definição de visão evoluiu de dois conceitos de planejamento das décadas de 50 e 60: gestão por objetivos e planejamento estratégico. Esses conceitos eram muito áridos e não conseguiam entusiasmar os funcionários, pois apoiavam-se fortemente em fatos e números fornecidos de cima.
O conceito de visão a seguir destina-se a corrigir essas falhas, por meio do envolvimento da mente e do espírito. De acordo com o especialista C. Lee, quando se cria uma visão "se está escrevendo uma Constituição, uma estrutura de referência para todas as pessoas".
Tal visão pretende que as pessoas repensem e reavaliem quem são e para que estão aqui. Por exemplo: segundo o especialista John Naisbitt autor dos livros Megatendências e Paradoxo Global (ambos, ed. Campus), nos últimos anos as ferrovias norte-americanas têm passado por dificuldades, em parte porque nunca enfrentaram corajosamente o negócio em que estão envolvidas. Durante anos operaram com se estivessem no ramo de trens, sem perceber que atuavam em transporte de mercadorias e pessoas. Eis um caso de confusão entre meios e fins.
Se o fim for transportar pessoas e mercadorias, um dos meios disponíveis será a ferrovia. Se o fim for construir e operar uma ferrovia, então o meio será o transporte de mercadorias e pessoas. Saber qual dessas duas visões é a base do planejamento e da operação faz uma grande diferença na administração do dia-a-dia.
É provável que os mesmos problemas de visão se apliquem à industria automobilística norte americana. Ela talvez deva se perguntar se está no ramo de fabricação de veículos ou no de transporte de pessoas e mercadorias. Se a finalidade desejada (visão) for transportar pessoas e mercadorias, logo chegará o dia em que se construirão monotrilhos ou outra forma de transporte compatível com a época (os meios).
Uma visão pode fornecer um mapa da direção futura e gerar entusiasmo por essa direção. Pode estabelecer ordem no caos e ainda fornecer um critério para medição do êxito. Mas, para ser realmente eficaz, a visão deve ser bastante coerente para criar uma imagem identificável do futuro, ser bastante convincente para gerar comprometimento com o desempenho, enfatizar o que pode ser e esclarecer o que deve ser.
Em resumo, no entender o especialista em liderança Warren Bennis, autor de Líderes e Lideranças (ed. Campus), uma visão é, em parte, racional (produto da análise) e, em parte, emocional (produto da imaginação, intuição e valores); envolve o yin e o yang da estratégia e do desempenho da organização.
A necessidade de uma visão nítida
Segundo as pesquisas e a experiência prática, é importante estabelecer uma visão nítida porque ela inspira e motiva, fornece orientação e promove o êxito, é essencial para as empresas do futuro e permite o benchmark do progresso e a avaliação dos resultados. É igualmente importante haver coerência entre as visões pessoais e a visão da organização. Essa coerência será difícil se as visões não forem claramente enunciadas.
Uma empresa com visão tem rumo, planeja seu futuro de forma eficiente e tem condições de trabalhar em conjunto. Contudo, ficou óbvio, e ao mesmo tempo surpreendente, que a maioria das companhias bem-sucedidas não tem uma visão empresarial clara.
Alguns consultores dizem que, quando reúnem pessoas-chave, elas mesmas se surpreendem com as divergências. Um dos oito princípios básicos da classificação da excelência dos especialistas em management Tom Peters e Robert Waterman, autores do clássico Vencendo a Crise (ed. Harbra), é "atenha-se ao padrão". Um bom conselho, mas difícil de seguir se não se souber exatamente qual é o padrão.
A necessidade de uma visão, entretanto, vai além. Ao adotar uma visão, as empresas e as pessoas poderiam fazer escolhas mais sensatas em recursos humanos. Assim, a organização teria maior probabilidade de selecionar novos funcionários cuja visão pessoal fosse compatível com a da empresa, e vice-versa. Em ambos os casos, a maioria dos equívocos poderia ser evitada.
Como nos certificar de "transformar a teoria em prática"
Após estabelecer e enunciar uma visão, particularmente da organização, é preciso apropriar-se dessa visão, acreditar nela, externá-la através do comportamento e das escolhas e pautar-se por ela todos os dias. É preciso transformar a teoria em prática. Muitas organizações pregam na parede um belo quadro com o enunciado de sua visão ou o imprimem em cartões de visita. Contudo, se o processo de elaboração da visão for apenas um capricho e/ou não for adotado por todos, tudo não passará de um enfeite de parede ou algo para ocupar o bolso.
Mesmo que compartilhada por todos, será preciso determinação para manter a visão, pois o mundo ao redor tentará constantemente ofuscá-la. Nossa visão, principalmente quando implica o modo como vemos a nós mesmos, sempre precisará ser protegida contra o desejo natural de escaparmos para uma zona cômoda.
Muitos resultados negativos poderão ocorrer se estabelecermos uma visão distante da realidade diária. Tal visão não fornecerá orientação real. Tampouco um benchmark realista, pelo qual se possa fazer uma autoavaliação.
Talvez ainda mais importante, essa distância da realidade poderá ser tudo, menos motivadora. Sérios reveses ocorrem devido a essa discrepância. O ceticismo que as organizações provocam quando não se pautam por suas visões acaba se transformando em falta de confiança generalizada.
O processo de elaboração da visão
Descobrir nossa visão real talvez seja uma questão de estabelecer os meios e os fins. Os exemplos de êxitos são muitos e diversificados. Por exemplo, há uma cadeia de fast-food de frango que descobriu ser sua visão (fim) proporcionar experiência de trabalho a jovens americanos. Ela atinge esse fim fazendo sanduíches de frango (meio). Se o meio e o fim fossem invertidos, seria uma operação muito diferente.
Um bom enunciado de visão deve expor aspirações financeiras e espirituais (os fins) em cerca de 25 palavras ou menos, segundo o especialista D. Shaaf. Sua formulação implica perguntas diretas e respostas honestas. Para John Naisbitt, "em algum momento devemos nos perguntar qual é, efetivamente, a natureza do nosso negócio".
Faça perguntas diretas e obtenha respostas sinceras
Qual é nosso objetivo? Qual é a força que nos impulsiona? Quais são nosso valores básicos? O que fazemos melhor? O que desejamos realizar? O que gostaríamos de mudar? Eis algumas perguntas que podem ajudar a saber quem somos e/ou quem desejamos ser.
Uma vez respondidas essas perguntas, é preciso considerar as "barreiras" potenciais que poderiam bloquear o acesso a visão. Pode-se então desenvolver um plano de metas, objetivos mensuráveis e planos estratégicos para realizá-la. Os executivos que quiserem mudar a cultura organizacional precisam, antes, ter uma sólida compreensão da situação atual, como foi formulada e como está funcionando. É preciso ter uma clara idéia de aonde se deseja chegar, como chegar lá e quais as possíveis conseqüências dessa tentativa.
Quem queremos ser e aonde queremos chegar é nossa visão ou fim desejado. As metas, os planos e os objetivos mensuráveis são os meios para chegar lá: um mapa do caminho, claramente definido.
As organizações que desejam criar e estabelecer uma visão eficaz precisam aplicar as perguntas e os planos acima mencionados segundo algumas diretrizes preestabelecidas:
A visão deve ser relativamente atemporal. Talvez sejam necessárias alterações caso ocorram grandes mudanças no ambiente, mas a visão deve ser estabelecida como se nunca fosse mudar;
Por outro lado, as metas e os objetivos (os meios) devem ser suficientemente flexíveis para possibilitar a realização da visão;
Tanto a visão (o fim) como as metas e os objetivos (os meios) com ela relacionados devem ter como base um conjunto de princípios ou parâmetros;
A visão deve incluir todos os integrantes da organização. Para ser estabelecida, a eficácia da visão depende, em última análise, da participação total dos membros da organização: eles precisam ser donos da visão para que esta possa ser implantada.
É preciso agora examinar mais detalhadamente um modelo ou plano de ação sugerido. Podem-se então examinar os instrumentos necessários.
O modelo
Esse modelo de visão, ou plano de ação é dividido em estágios (veja quadro). Os dois primeiros exigem a percepção individual e independente da atual visão da organização por parte de todos os seus membros. O terceiro estágio exige que a equipe gerencial chegue a um consenso sobre a visão da organização e estabeleça metas e objetivos mensuráveis. O estágio final exige que cada executivo se reúna com seus colegas (membros da equipe) e, juntos, estabeleçam metas e objetivos individuais mensuráveis baseados na visão.
Estágios para colheita de informação
No estágio, a equipe gerencial deve responder a um questionário. Os níveis organizacionais que serão incluídos nesse estágio são opcionais. O questionário sugerido é uma versão revisada do questionário de Quociente de Intenção Estratégica (SIQ, na sigla em inglês), de Warren Bennis. É importante que todas as pessoas preencham o formulário sozinhas e ao mesmo tempo, sem trocar idéias, e de surpresa, para reduzir a possibilidade de serem influenciadas pelos outros. Os resultados serão mais eficazes se as respostas forem espontâneas e pessoais.
Os grandes navegadores sempre sabem onde fica o norte. Sabem aonde querem ir e o que fazer para chegar a seu destino. Com as grandes empresas acontece a mesma coisa: elas têm visão. É isso que lhes permite administrar a continuidade e a mudança simultaneamente.
James Collins e Jerry Porras